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QUAL É O impacto das operações policiais nas edificações das favelas cariocas?



Recentemente o Complexo da Maré sofreu com diversas operações policiais em seu território. Não muito longe dali, no Complexo do Alemão e da Penha ocorreu mais uma operação policial que deixou escolas municipais sem aulas, impactando milhares de alunos que deixaram de ir à escola. Na saúde, unidades básicas de saúde (UBS) também foram impactadas, tendo seu funcionamento comprometido. Isso sem falar no impacto do deslocamento dos moradores dentro e fora dos territórios, para trabalhar ou resolver alguma demanda pessoal. Tudo é interrompido devido às operações policiais.


Sem julgar a efetividade das operações policiais, pois existem organizações sérias e comprometidas que debatem o tema. Queremos com esse texto, alertar sobre os impactos que tais operações podem gerar nas edificações (casa, prédio, construções, etc) e consequentemente no “bolso” do morador, refletindo na renda familiar de quem mora em favela.


Já não é de hoje que casos de prejuízos edilícios em favelas, decorrentes de operações policiais são noticiados em jornais e nas redes sociais. Ao fazermos uma simples pesquisa nos principais portais de notícias podemos ver o impacto de tais confrontos não só no cotidiano dos moradores, como também na infraestrutura presente nesses territórios. Ruas, becos e vielas sem energia elétrica. Caixas d’água individuais e coletivas alvejadas. E até paredes, portas e janelas deterioradas por conta de disparos de armas de fogo.



O relatório "Favelas na Mira do Tiro", divulgado no mês passado, pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania. Levantou através de pesquisa com moradores dos complexos da Penha e de Manguinhos, os impactos da guerra às drogas na economia dos territórios. De acordo com o levantamento, os prejuízos decorrentes de reposição ou reparo de bens danificados por conta dos confrontos chegam a R$ 4,7 milhões por ano, somando os dois complexos. Já os gastos com a estrutura da casa, decorrentes de operações policiais somam 1,1 milhão. Tendo um prejuízo médio de R$ 260,23 com a estrutura da casa. Isso corresponde a 10,9% dos entrevistados que relataram danos como tiros em paredes, janelas, telhados, caixas d’água e encanamentos, portas arrombadas, maçanetas e portões destruídos.


Essa realidade reflete um conceito chamado de poverty penalty ou penalidade da pobreza em tradução livre. Que nada mais é do que um fenômeno onde pessoas em situação de pobreza tendem a pagar mais caro para consumir produtos e serviços do que os ricos. Esse conceito ficou conhecido após a publicação do livro The Fortune at the Bottom of the Pyramid” de C. K. Prahalad em 2005.


Ao terem que investir recursos para reparar os danos causados pelos confrontos, os moradores de favelas acabam gastando mais, pois o ciclo de vida de um produto acaba sendo encurtado, devido aos danos. Fazendo com que estes moradores consumam mais, não por desejo mas, pela necessidade de reparo ou reposição. Havendo fuga de um recurso que poderia ser investido na educação, saúde ou lazer de algum membro ou de toda família.





Além dos impactos econômicos na vida de quem reside em favelas, vemos um outro problema nesse curto ciclo de vida dos bens adquiridos e avariados. Há também o impacto ambiental que estes produtos geram, seja devido a necessidade de aumento na produção do produto ou material, como também no descarte do mesmo ao se tornar inutilizável. Pois, sabe-se que nos territórios das favelas cariocas, a gestão de resíduos é um grande desafio e a logística reversa é praticamente inexistente nesses territórios. Isso gera um problema sistêmico de descarte irregular de resíduos que contribui para a proliferação de doenças, devido a presença de vetores como ratos, mosquitos, moscas e baratas.


O que parece ser somente uma operação policial, acaba contribuindo ainda mais com o aumento das desigualdades, estagnando os mais vulnerabilizados cada vez mais na pobreza, consequentemente, contribuindo com o aumento não só da violência no local, como também impactando na economia, saúde pública, educação, moradia e meio ambiente.


Isso só expõe uma enorme necessidade de políticas públicas integradas nesses territórios que ataquem o cerne da pobreza de maneira multidimensional como deve ser. Entendendo que não é só uma operação policial que irá acabar com a violência nos territórios vulnerabilizados, mas sim, um conjunto de ações articuladas que permitam romper com a situação de pobreza, gerando mais dignidade e prosperidade para os moradores de favelas.


Visto os impactos no cotidiano e na própria infraestrutura existente no território, que já são precárias por falta de planejamento urbano e inação do estado, que só está presente nas favelas na sob o “guarda-chuva” da segurança pública. Não seria urgente investir os recursos empregados nas operações policiais em melhorias sistêmicas nas favelas?  



Mabi Elu é engenheira civil. Mestre em engenharia geotécnica pela UERJ e consultora de Projetos de Engenharia na Favelar.

Fábio Moraes é especialista em urbanismo social pelo Insper. Fundador e consultor de urbanismo social na Favelar.


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